Suzana Queiroga: “O Mundo Segue Indiferente a Nós” (2021)

 

Detalhes de algumas obras mostradas na exposição O Mundo Segue Indiferente a Nós no Espaço de Intervenção Cultural Maus Hábitos. Junho e julho de 2021, Porto, Portugal

 

Foi ao depurar um processo de criação iniciado em 2020, já em contexto da pandemia do covid-19, que a artista luso-brasileira Suzana Queiroga idealizou uma grande instalação projetada especialmente para a sala de exposições do Maus Hábitos, extrapolando matrizes bidimensionais para gerar espacialidades e concretizações escultóricas, possibilitando diversos percursos factíveis ou imaginários, onde a escala da obra inevitavelmente prescreve uma relação corporal com o público, que diante de um emaranhado de escadas maleáveis e suspensas, pode caminhar em torno da peça para explorar os diferentes pontos de vista e as infinitas possibilidades de encadeamentos entre camadas que se sobrepõem nesta criação que também dá título à exposição.

No ano passado, a artista deu início à série “O Mundo Segue Indiferente a Nós”, explorando inicialmente incisões em papéis para construir formas através de lacunas e, ao sobrepor as tais folhas em camadas, algo novo surgiu no seu decurso, confirmando tópicos já investigados anteriormente com relação aos traçados urbanos e fluxos variados, mas desta vez, captando sobretudo o conceito de tempo e infinito, concedendo visibilidade ao inefável, onde há um raciocínio visual que elucida um tempo que nos direciona a uma maior consciência sobre a nossa efemeridade e, também, sobre a urgência de uma cosmovisão, de uma noção sobre a nossa interdependência de um modo mais globalizado.

E se é da incisão na matéria que cada trabalho da artista se revela, é igualmente através da suspensão de cada plano recortado que nós podemos compreender possíveis denúncias nas cartografias reveladas nas suas criações de anos atrás, das quais a interferência humana em paisagens durante todo o processo de civilização – pautado na destruição e justificado como progresso – está impregnado. Neste sentido, a trajetória de Suzana Queiroga é continuamente decolonial.

E, nesta atual fase em que a matéria têxtil proporciona um acesso metafórico a um plano não terreno, a artista expõe o presente e trágico período de crise sanitária que atravessamos, delatando a desigualdade social gerada pelo funcionamento capitalista que hierarquiza vidas e, sobretudo, ao utilizar o feltro (um isolante térmico) como matéria da sua mais nova criação, Suzana comenta a circunstância vigente de isolamento em unidades familiares, espaços compartilhados de moradia, ou domicílios individuais, contudo também narra o permanente risco diante de um vírus que transpõe fronteiras.

O projeto é uma reflexão sobre a fragilidade e brevidade da nossa existência e, embora destile certo ceticismo, não deixa de apontar caminhos lúdicos e subjetivos para destinos que transcendam a realidade.

 

Tales Frey

Curador

 

Detalhes de algumas obras mostradas na exposição O Mundo Segue Indiferente a Nós no Espaço de Intervenção Cultural Maus Hábitos. Junho e julho de 2021, Porto, Portugal

 

Programa Paralelo da Exposição O Mundo Segue Indiferente a Nós

23 de junho de 2021, 17h

21 de julho de 2021, 21h

“Em Fluxo” (Sessão de filmes e Conversa com Suzana Queiroga e Tales Frey)

 

31 de julho de 2021, às 15h (até às 18h)

Finissage: Lançamento do catálogo “O Mundo Segue Indiferente a Nós”

 

 

Clipping

artecapital.net, junho de 2021

 

Detalhes de algumas obras mostradas na exposição O Mundo Segue Indiferente a Nós no Espaço de Intervenção Cultural Maus Hábitos. Junho e julho de 2021, Porto, Portugal